quinta-feira, 26 de junho de 2008

Deus, um eleitor indeciso!

Havia prometido pra si mesmo que não se envolveria. Deixaria isso para os outros. Mas o marketing foi tamanho que o Todo-Poderoso não aguentou e resolveu descer pra ver como andava a peleja das urnas. Foi recebido com toda a pompa e circunstância devidas. Entretanto, estranhou quando um dos presentes anunciou em alto e bom som que " Deus o havia escolhido para ser eleito e que sua gestão seria guiada pela mão de Deus."
Achou engraçado. Não conseguia lembrar de quando fez isso e nem o porquê de escolher tal sujeito. Também são tantos problemas a resolver que até Ele se confunde. Mas, por via das dúvidas, achou melhor sair de fininho antes que pedissem que Ele vestisse a camisa. E se tem algo que Ele não gosta é vestir a camisa. Pior que isso, só usar boné de candidato.
Parou em outro lugar mais sereno. Discreto, não permitiu que Sua presença fosse notada. Sentou no último banco. Estava gostando da música agitada que tocavam e esperava ouvir uma edificante mensagem. Mas seu desejo não foi atendido de imediato. O púlpito foi ocupado por um carismático cidadão que pedia auxílio oracional para sua empreitada política. Exortava o povo a dobrar o joelho em oração pois " a luta era grande, mas o Senhor estava com ele."
Deus sentiu vontade de interromper o falatório, mas os gritos de "Glória", "Aleluia" eram tão altos que desistiu da idéia.
E o Todo-Poderoso foi-se mais uma vez.
Tentou uma última parada, acreditando na possibilidade humana para o bem. E para sua surpresa( se é que isso pode acontecer), encontrou o que procurava. Nenhum pretexto manipulativo. Nenhuma segunda, terceira ou quarta intenção. Uma celebração sincera. Era bom demais.
Bom demais pra ser verdade.
Ao final da Palavra, uma reunião de emergência foi convocada. Assunto de extrema importância. Entrou sem ser notado e se sentou no meio do povo. Reconheceu de imediato o engravatado que estava em pé no centro. E como o conhecia. Conhecia cada parte daquele corrupto cidadão, cada falcatrua, cada desvio de verba.
E Deus se indignou. Não com o corrupto. Mas com aquele que estava ao lado dele. Abraçando-o e dizendo que " este é o homem que Deus ungiu para governar esta nação. Este é o brilho dos olhos do Senhor".
Mesmo não podendo, Deus queria ficar cego nessa hora. Só assim pra não ver tamanha cara-de-pau. Aliás, nem assim.
Depois dessa, desistiu das eleições. Ou pelo menos de tentar acompanhá-la. Mas pensou por um momento. Com tantos, reivindicando Seu apoio, pra onde iria Seu voto?
E viu-se transformado. Transformado em um eleitor indeciso. Pelos caprichos de homens que julgam falar em nome dEle, sem nem ao menos conhecê-lo de verdade.

Gilberto Cardoso, professor de língua portuguesa da Escola Padre Maurício e estudante de Letras da UEMA

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